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O atalho que custa caro

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Tentar um atalho é sempre um risco. Em diversas situações corriqueiras, tentamos um atalho, isso não é uma novidade para os seres humanos. Se podemos chegar ao mesmo lugar com menos esforço, não há nenhum motivo para escolhermos o caminho mais árduo ou mais longo. Quase ninguém tem prazer com o sofrimento, portanto podemos dizer que procurar atalhos é a condição natural de um ser humano: procuramos atalhos para enriquecer, tentamos atalhos para emagrecer, assim como buscamos atalhos para aprender uma língua estrangeira como o alemão.

É tentador imaginar que podemos contornar uma questão gramatical problemática, que podemos evitar o estudo ou a atenção para aprender ou introduzir regras de uso de uma língua. Sempre tentamos fazer comparações com nossa língua materna focando no que é igual, fazendo comparações que teoricamente nos ajudariam a dominar um ou outro ponto da gramática. Seria muito bom se as línguas tivessem uma correspondência tão direta entre uma e outra, não sei se exatamente bom, mas pelo menos facilitaria a vida de quem deseja aprender outra língua. Contudo, a realidade não é esta. 

No aprendizado e ensino de línguas, os atalhos geralmente levam a desastres e à perda de tempo. Quando uma questão é espinhosa, o pior que um aluno ou um professor pode fazer é evitar tal questão ou tentar simplificá-la com perdas quanto à definição correta ou quanto ao uso correto. Simplificar não é ruim, mas criar uma definição simples que não tenha correspondência com a realidade ou que não se aplique nas situações em que deveriam se aplicar não facilitará o trabalho, apenas piorará a situação, pois o aluno termina por memorizar uma regra que não existe, que não se aplica. De nada adianta memorizar uma regra simples se ela não é efetiva. Esclarecer é muito mais relevante que simplificar.

O melhor que os atores envolvidos – professores e alunos – podem fazer é tentar explicar com clareza como funciona a língua-alvo e como funciona a língua nativa do aluno. Essa comparação deve ser feita com muitos exemplos, e o aluno também deve ser estimulado a fazer suas próprias frases, ajudando na interiorização dessas novas estruturas. Essa comparação que deve ser feita pelo professor, focando nas distinções, é extremamente valiosa, pois chama a atenção para o fato de que naquele ponto em específico o erro é previsível ou provável. O erro é previsível ou provável porque estamos diante de uma situação em que a língua a ser aprendida usa uma divisão do campo semântico ou uma estrutura gramatical distinta da língua nativa do aluno, que é língua que servirá de base, caso a nova regra não seja aprendida. 

Vejamos alguns erros comuns cometidos por brasileiros ao falar alemão. A primeira frase é a frase errada, a segunda seria como um falante nativo do alemão usaria os elementos da oração.

(errado) Ich möchte studieren in Deutschland nächstes Jahr

(certo) Ich möchte nächstes Jahr in Deutschland studieren 

(errado) Ich lerne Deutsch jeden Tag, weil ich will wohnen in Deutschland nächstes Jahr

(certo) Ich lerne jeden Tag Deutsch, weil ich nächstes Jahr in Deutschland wohnen will

Tenho visto esses erros recorrentemente nos alunos que me procuram com algum conhecimento prévio do alemão. Nem considerei os erros de declinação nos exemplos dados para não poluir nosso foco, mas estes geralmente vêm também. Vamos prestar atenção apenas nos erros prováveis quanto à ordem das palavras. Podemos observar que os erros cometidos são previsíveis, eles espelham a ordem de palavras do português. A ordem entre os tipos de advérbio, a ordem entre objeto e advérbio, a posição do verbo na oração subordinada, tudo está conforme o português. O alemão tem uma sintaxe muito distinta da do português, por isso o aluno que tenta aprender alemão ignorando esse tema não chega muito longe. Vamos refletir um pouco sobre o inglês, com as mesmas frases acima. Todas as sentenças estão corretas:

 

Eu gostaria de estudar na Alemanha no próximo ano

I would like to study in Germany next year

 

Ich möchte nächstes Jahr in Deutschland studieren 

Eu estudo alemão todos os dias porque eu quero morar na Alemanha no próximo ano

 

I learn German everyday, because I want to live in Germany next year

Ich lerne jeden Tag Deutsch, weil ich nächstes Jahr in Deutschland wohnen will

 

No primeiro exemplo, podemos observar claramente que o inglês tem uma sintaxe muito próxima da nossa. A posição do verbo “estudar”/“to study” são as mesmas, logo após o verbo modal. O alemão coloca o verbo principal lá no final da oração. A posição entre os advérbios também é a mesma, com o português e o inglês colocando o advérbio de lugar antes e depois o de tempo, enquanto o alemão coloca o de tempo antes para só depois colocar o de lugar. 

No segundo exemplo, podemos observar mais uma vez o quanto ordem das palavras do inglês é próxima da do português. Na oração subordinada encabeçada pelas conjunções “porque” e “because”, não há nenhuma mudança na ordem das palavras. No alemão, temos uma mudança: o verbo da segunda posição, que aqui é o verbo modal, é lançado para o fim da oração, colocado após o verbo principal que já estava naturalmente no fim. Além dessa questão, podemos observar que tanto o português quanto o inglês têm as mesmas posições para o objeto “alemão”/“German” e o advérbio “todos os dias”/“everyday”. 

Concluímos que, ao estudar alemão, o aluno precisa dedicar parte de seu tempo para estudar essas regras de posição e produzir frases pensando nessas regras ao ponto de automatizar essa nova estrutura que é diferente da estrutura de nossa língua nativa. Precisamos estar constantemente produzindo frases em alemão, refletindo sobre essas questões, até que o cérebro entenda ou interiorize que, ao usar o vocabulário do alemão, as regras de uso ou de posição são outras. Essa interiorização leva um tempo e precisa de dedicação e uma boa orientação também, mas ela é completamente alcançável, inclusive em pouco tempo, se a orientação for bem feita e o aluno estiver disposto tanto a aprender essas regras quanto a praticar com exercícios semanais focados nessas dificuldades previsíveis, mas evitáveis.     

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